sábado, janeiro 13, 2007

DON JUAN - TRADUÇÂO

Inauguramos um novo ano com novidades no Inhame Filosofante. A partir de agora teremos traduções do inglês para o português e vice-versa (talvez, futuramente, teremos também do espanhol). Começo com Lord Bayron e a tradução do seu poema Don Juan. Para tal, tentei manter a versificação do inglês no português, isto é, mantive o mesmo esquema da rima, que é alternada nos seis primeiros versos e paralelas nos dois últimos (a-b-a-b-a-b-a-b-c-c). Não mantive a métrica porque eu não entendo muito de métrica em inglês. Uma vez que esta é baseada nos sons, no modo que se pronuncia a palavra, fica difícil imaginar como um homem do início do século XIX falava (principalmente em inglês com sesu infinitos modos de falar abreviado). Sem contar que o poeta pode alterar o modo de falar de algumas palavras para encaixá-las no seu poema. Preferi, então, fazer a tradução em versos livres. Peço aos meus três leitores (e eu sei que estes leitores são feras em inglês) que dêem sugestões e analisem a minha tradução. Mas lembrem-se: traduções são como as mulheres: as boas não são fiéis e as fiéis não são boas. Talvez a minha tradução não seja nenhuma das duas. Muito bem! Vamos ao Don Juan:

DON JUAN


Veneza, 16 de setembro de 1818
Canto Primeiro
(excerto)

Eu desejo um herói, um herói extraordinário,
Quando cada janeiro lançar em frente um novo janeiro
E até de jargões saciado o oficioso diário,
As eras descobriram que ele não é o verdadeiro;
Sendo assim eu não cuidarei do seu louvatário,
Por isto escolhi Don Juan, nosso velho companheiro;
Todos nós o conhecemos em cima do tablado[1],
Mandado antes do tempo para o diabo.

Vernon, Wolfe, Howke, Cumberland o estripador,
Príncipe Ferdinand, Granby, Burgoyne, Keepel, Howe,
Bons e maus, tiveram sua parte no louvor;
Como Wellesley deixaram também o seu sinal,
Cada um, como o rei Banquo, avança com esplendor;
Seguidores da fama, “os nove leitões”[2] da porca ancestral:
A França, também, teve Napoleão e Dumorier
Registrados pelo Moniteur e Courier.[3]

Barnave, Brissot, Mirabeau, Condorcet,
Petion, Clootz, Marat, La Fayette, Danton,
Eram franceses famosos como devemos saber;
E existiram outros, pouco esquecidos até então,
Hoche, Marciau, Lannes, Desaix, Moreau, Joubert,
Com muitos militares – tropa e pelotão -
Por eras serão extremamente notáveis,
Mas aos meus versos não são aceitáveis.

Nelson da Bretanha foi o senhor do mar,
E ainda deve sê-lo, mas a maré está mudando;
Não há nada mais a ser lembrado de Trafalgar[4],
Nosso herói está entre nós, na urna descansando;
Porque o exército tornou-se popular,
E até os marinheiros estão disso se aproveitando,
Além disso, o príncipe é, para todos, da pátria o guardião,
Relegando Duncan, Nelson, Jervis à escuridão.

Antes de Agamêmnon bravos homens viveram,
E desde então vão se superando em valor e sabedoria;
Calma como nenhuma, uma boa negociação tiveram,
Mas sobre eles os poetas não fizeram nenhuma elegia;
Não condeno a ninguém porque deles se esqueceram,
Porém não acho em nossa era homens com tal maestria,
Ajustado de tal maneira a minha poesia vã,
Então, como disse, aceitarei nosso amigo Don Juan.


VENICE, September 16, 1818.
CANTO THE FIRST.
I WANT a hero: an uncommon want,
When every year and month sends forth a new one,
Till, after cloying the gazettes with cant,
The age discovers he is not the true one;
Of such as these I should not care to vaunt,
I 'll therefore take our ancient friend Don Juan-
We all have seen him, in the pantomime,
Sent to the devil somewhat ere his time.

Vernon, the butcher Cumberland, Wolfe, Hawke,
Prince Ferdinand, Granby, Burgoyne, Keppel, Howe,
Evil and good, have had their tithe of talk,
And fill'd their sign posts then, like Wellesley now;
Each in their turn like Banquo's monarchs stalk,
Followers of fame, 'nine farrow' of that sow:
France, too, had Buonaparte and Dumourier
Recorded in the Moniteur and Courier.

Barnave, Brissot, Condorcet, Mirabeau,
Petion, Clootz, Danton, Marat, La Fayette,
Were French, and famous people, as we know:
And there were others, scarce forgotten yet,
Joubert, Hoche, Marceau, Lannes, Desaix, Moreau,
With many of the military set,
Exceedingly remarkable at times,
But not at all adapted to my rhymes.

Nelson was once Britannia's god of war,
And still should be so, but the tide is turn'd;
There 's no more to be said of Trafalgar,
'T is with our hero quietly inurn'd;
Because the army 's grown more popular,
At which the naval people are concern'd;
Besides, the prince is all for the land-service,
Forgetting Duncan, Nelson, Howe, and Jervis.

Brave men were living before Agamemnon
And since, exceeding valorous and sage,
A good deal like him too, though quite the same none;
But then they shone not on the poet's page,
And so have been forgotten:- I condemn none,
But can't find any in the present age
Fit for my poem (that is, for my new one);
So, as I said, I 'll take my friend Don Juan.

[1] Referência a peça de Moliére
[2] “nove leitões” – referência irreverente aos nove nomes do começo da estrofe., comparado aos oito reis e depois a Bonquo (personagem que aparece em Macbeth). Na verdade é mais um jogo lingüístico de Byron, do que uma referência exata.
[3] Jornais da época. O Moniteur continua existindo na Bélgica.
[4] Batalha em que a frota marinha de Napoleão foi derrotada e acabou com o sonho deste de conquistar a Inglaterra, levando a guerra para lá.